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Sete Vidas Como os gatos

More than meets the eye

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Sete Vidas Como os gatos

28
Jan09

Parecenças

Rui Vasco Neto

Já vos falei da caixa de correio cheia, das palavras que bateram com as vírgulas na porta enquanto eu fui ali e já vim. Estas são dessas, vêm de um amigo de letras que as trata com um jeito tão singular que elas parecem mais brilhantes que as minhas, mais polidas, mais e melhor arranjadas para sair. E eu pareço aquela vizinha invejosa que um dia lhe há-de descobrir a marca do segredo que usa para as trazer assim, bonitas como estas que me deixou no último dia de 2008 com um bilhete preso e que eu só li no ano seguinte: «Grande Rui: Mando-te uma história, das do tal género maluco, para o teu blogue, se lá couber.» Pfff, 'se lá couber', calculem... danadinho para escarnecer da pobreza, este meu amigo, digo a rir. Falando a sério? Um senhor, é o que ele é. E um senhor escritor. Fernando Venâncio.

 

Em baixo: "Parecenças

Sete vidas mais umaFernando Venâncio 

 

 

Detesto a cara dele. E o sorrir dele. E o andar dele. Para ser sincero, detesto nele tudo. Evito cruzar-me com ele, inicio já de longe desvios impensáveis. Mas será ele desagradável? Feio? Disforme? Longe disso. De modo nenhum. E essa é, já, uma parte da razão.
 
Vou direito ao assunto: ele parece-se com um grande amigo meu. Trata-se de um fulano conhecido do público e por quem tenho um apreço desmedido. Parece-se com ele, disse eu? São duas gotas de água. Esta gota é, concedo, um tudo-nada mais jovem, mas acredite-se: quando ele se me pespega na frente, isso de mais jovem não ajuda puto. É sempre àquele outro, ao meu amigo, que ali vejo. E isso confunde-me, troca-me o neurónio, como um paradoxo inútil. É tipo aqueles cubos desenhados, só arestas, em que as profundidades se cruzam e descruzam. Mas agora na versão parva.
 
Já me apeteceu contar-lho. Simplesmente confessar. Dizer assim: «Desculpe lá, amigo, a gente nem se conhece a bem dizer, mas acontece o seguinte: você, desculpe tratá-lo assim, você faz-me sempre lembrar o... (e citaria o ilustre nome), e por isso o miro e remiro, por isso fujo de si.»
 
Mas nunca consigo. Ele esgueira-se, felino, etéreo, risonho. Sim, é aquele sorriso que me mata. E que, se ele não se acautela, um dia destes há-de matá-lo mesmo.

 

4 comentários

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    venancio 10.02.2009

    Arre, já não pode um gajo fantasiar...

    A sério, M.J.: o «eu» da literatura é muitas vezes o «eu» da biografia. Mas tenha cuidado. Não o é sempre. Isto não é mecânica.
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    M.J. 11.02.2009

    Venancio, não, não é mecânica. Mas é um mecanismo que mexe com sentimentos, sensações, desejos. «O "eu" da literatura é muitas vezes o "eu" da biografia.». De acordo., tão de acordo que diria estar o autor, por vezes, demasiado alheado de si próprio que nem dá pela verdade biográfica que ressalta dos seus textos. Depois, «um gajo fantasiar» com outro gajo...
  • Sem imagem de perfil

    venancio 11.02.2009

    M.J.,

    Tu leste «fantasiar com outro gajo». São palavras tuas. Eu escrevi só «fantasiar», portanto «fantasiar um conto». Se queres, «fantasiar um gajo».

    É o que fazem os escritores, amigo: fantasiar gajos e gajas. Uma promiscuidade do caneco.
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