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Sete Vidas Como os gatos

21
Abr09

Crónica de café

Rui Vasco Neto

Adoro um bom café, essa é que é a verdade. Gosto do sabor, do aroma, da forma única como mexe comigo, com o meu organismo, com as minhas sensações. Como agita os meus nervos (‘guizos de oiro a tilintar’, Florbela dixit) e assim dispara as minhas energias em todas as direcções num espasmo de mil sabores, antes de deixar na boca e nos lábios aquele gosto bom e intenso que vira memória do prazer. É um vício antigo, descobri cedo, um prazer que não dispenso desde que aprendi a saborear, a prolongar o encanto, dosear a sofreguidão e bebericar em pequenos goles para que dure mais. Para que seja eterno enquanto dura. Assim aprendi os amargos de boca, também, vinham no pacote. No geral sobrevivi ao alcalóide fatal da coisa, ao que mata a sério. Cá estou, ainda fã.

 

Já bebi de tudo, há que confessar. Em todos e cada um o seu encanto particular, único, irrepetível, o seu gosto peculiar. Provei longos, curtos, intensos, mornos, cheios, frios, escuros, claros, fortes e suaves. Escaldei-me, não raro. Tive-os intoxicantes, daqueles que arrasam o bem estar e deixam marca, quantas vezes alergias de pele e outras. Biquei-os descafeinados, incapazes de fazer mal, porque tão assépticos como insonsos. Mas quentinhos, lá está, breve consolo e pouco mais. É a tal coisa: café é café, sabe sempre bem, nem que apenas por hábito, saudável exercício. E às tantas a gente habitua-se ao paladar, àquele qualquer que as circunstâncias plantaram no nosso caminho porque ficava mais perto ou dava mais jeito ou até nem era mau de todo, que sei eu, é assim e pronto, tanta vez... E de repente passa uma vida inteira sem que se prove doutra marca, outro lote, outra mistura. Assim se perde a capacidade de escolha por anulação voluntária, por desistência das papilas, gustativas mas menos, cada vez mais.

 

No meu caso nem tanto, é certo, feitios, talvez. Continuo dependente daquele consolo, fã incondicional do sabor, pese resignado ao breve, razoável, sofrível, que vai sendo regra acontecer. Mesmo assim mantém o fascínio, aquela irresistível incógnita gustativa. E as chávenas estão cada vez mais fashion, reconheça-se, mais bonitas, mais cuidadas e elegantes, desde que alguém fez a esmola de descobrir o quanto a cobiça do olhar aumenta a vontade da prova. E assim sigo bebericando o meu cafezinho, como sempre, como dantes.

 

Só que entretanto descobri um Nespresso, ou lá o que é aquilo, coisa recente. Então e não é que ando convencido que nunca mais quero outra coisa? Pois que seja eterna a convicção. Enquanto durar, claro.

 

2 comentários

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    Rui Vasco Neto 22.04.2009

    daniel,
    bom que gostaste, amigo, mas... Drumond?!! É o que dá andares tão fugido, tão arredado da fidelidade que nem lhe reconheces o soneto...
    abraço-te na mesma, gosto horrores de ti, que hei-de fazer?
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