25
Abr08
Poema renascido
Rui Vasco Neto
Da escritora Soledade Martinho Costa recebo as palavras com que vos deixo, este 'Poema renascido', «escrito hoje, com a visão mais recente do meu Abril», diz-me em recado privado. Sigo na boleia desta autora, que hoje me honra com a sua presença e produção original, à descoberta desse dia inventado: um novo 25 de Abril no coração português. Os senhores ainda se recordam de 1974? Daquela onda imensa, transbordo de emoções levantadas do chão pisado que era a gente, por obra e graça do 'não aguento mais' de uns quantos que levou ao 'porra, já chega' geral? Pois passaram trinta e quatro anos, trinta e quatro. Tudo mudou, como manda a lógica inexorável do tempo. Mas então e se, imaginemos, Abril voltasse a percorrer as nossas ruas, hoje mesmo, que Portugal estaria à janela? E que vozes se ouviriam, que palavras de ordem chegariam aos ouvidos desta nação adormecida? Que país seríamos se hoje, Abril, fosse Abril outra vez? Só o talento literário para me emprestar esse milagre, por um minuto que seja. Soledade Martinho Costa faz as honras. A liberdade vai passar por aqui.
Em baixo: "Poema renascido"
Sete vidas mais uma: Soledade Martinho Costa
Se Abril voltasse
A percorrer as ruas
E com ele na mão
Um cravo rubro
Os anseios que nascessem
Nesse dia
Trariam a certeza
De que os homens
Nem sempre procuram
A magia
Que faz dormir em paz
As consciências.
Se o outro Abril
Não passou de um sonho
Se respiramos hoje
Esta amargura
E os cravos se tornaram
Cor de bruma
A seara continua
A oferecer ao vento
O dourado do manto
E a formosura.
A murmurar, talvez
Que o Norte anda à deriva
Sem rota, sem leme ou timoneiro
Mas que resiste em nós.
A segredar ao coração
A tempo inteiro
É urgente ir em busca da bonança
E deixar que o Sol rompa o nevoeiro.
A fé não está perdida
É urgente ir em busca do poema
Que se fez bandeira
E fez canção
Em nossa voz
Agora adormecida
À espera de a ouvirmos
Renascida
Cantada noutro tom
Em vez primeira.