A situação filmada centra-se em duas pessoas, a professora e a aluna. Não está em causa, penso eu, qualquer dúvida quanto à incorrecção do comportamento desta aluna. Ela foi total e por demais evidente, não tem desculpa ou atenuante à primeira vista. Tudo parece começar como uma brincadeira que foi longe demais, um desafio assumido a uma autoridade que evidentemente já não era respeitada, logo à partida. Uma exibição tola de afirmação perante a turma e um exercício de cumplicidade com os colegas, que correu mal por ter sido levado longe demais. O comportamento desta adolescente de 15 anos foi mais do que impróprio: foi aberrante, nem bom nem mau. Toda a situação é em si aberrante, aliás. Os termos em que a aluna se dirige à professora, o seu tom de voz, o que diz e como diz, a postura gestual que assume logo à partida, tudo nesta garota é revelador de uma evidência que se perde no meio da algazarra: o problema tinha já começado antes de começar naquele dia. Muito antes. O problema vem de raiz e é um problema composto, são vários problemas juntos, todos graves, nem todos referentes ao universo escola. Na circunstância, não tendo sido capaz de fazer parte da solução, esta professora fez, também ela, parte do problema.
Não é dispensável um olhar crítico à actuação da professora naquela circunstância em concreto. A forma como ela lidou com a situação, como geriu o problema, a atitude que escolheu tomar (ou aquela única de que foi capaz), foi correcta? E em caso afirmativo, terá sido a mais indicada? Um duplo não seria a minha resposta, sem hesitar. Esteve longe da sensatez esta senhora, profissional do ensino, há que reconhecê-lo. Atrevo-me a especular se não terá sido um pouco vítima de si própria, também, mais que só dos outros. A sua postura, visível nas imagens, não cumpriu os mínimos de autoridade necessária para ter mão numa turma de alunos. Há nela um déficit de firmeza que se nota sem engano, alguma demissão da função disciplinadora do professor enquanto tal. Veja-se o ambiente em que tudo aconteceu, para começar; tinha tudo o que não deve existir numa sala de aulas, desde o barulho à desatenção, toda a gente de pé, risos e bocas, comentários e indisciplina geral. Sobrava confusão, faltava carisma de professor.
Logo no início, às primeiras palavras da aluna, não se viu a esperada, necesssária e correcta atitude de firmeza da parte da professora que, sendo firme e autoritária naquele momento como lhe competia, teria posto um ponto final e imediato em toda a questão. E o que vimos, em vez de firmeza e autoridade de professor? Assistimos a uma professora visivelmente intimidada e insegura a fazer o que faria qualquer coleguinha da mesma idade da garota: puxar mais, empurrar mais, discutir no braço o que devia estar resolvido na voz, ponto assente e não passível de discussão. E assim fragilizada e em queda de autoridade se expôs ao gozo generalizado da turma, um gozo que estava já presente no início, antes de tudo começar, como se pode de resto constatar pelo visionamento das imagens daquele ambiente indisciplinado, favorável ao tipo de evolução a que se pôde assistir. Confrangedor, convenhamos.
O episódio é triste mas não é para esquecer; pelo contrário, entendo que deve ser recordado este incidente. Mas só quando puder ser recordado numa análise serena. Só quando acalmar a indignação geral e baixarem quer o tom sindicalista da revolta, quer os dedos acusadores que agora se erguem todos num só movimento nacional. Com toda a politiquice rasteira que infecta de momento a questão educativa em Portugal, toda a reflexão sobre este incidente parece-me para já comprometida. Há que aguardar melhores dias. Quando o calor dos argumentos e a paixão dos queixumes derem finalmente lugar à razão e objectividade necessárias para, mais do que ver este video, se conseguir compreender de facto o que ele representa na vida de todos nós.