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Sete Vidas Como os gatos

More than meets the eye

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Sete Vidas Como os gatos

31
Mai08

Rehab Amy, the Wine House

Rui Vasco Neto

Ontem, Amy Winehouse deu show no Rock in Rio/Lisboa. Deu o show que se esperava, cumpriu as expectativas e contentou uma multidão ululante de noventa mil espectadores que se deslocaram à Belavista para a ver e ouvir (!?!). Foi bom, foi bem, foi espectáculo? Foi Amy, ela própria, mais do mesmo para quem já conhecia, uma novidade sem novidade para aqueles que apenas ontem a conheceram. No geral, eu diria que foi triste.

Por todas as razões que me escuso a explicar e por todas as outras que não deveriam ter necessidade de explicação, reproduzo aqui o texto que escrevi na noite em que Amy Winehouse venceu cinco Grammys em Los Angeles (quer dizer, em Los Angeles estavam os Grammys e a cerimónia de entrega dos ditos, que Amy, essa, estava em, Londres, proibida de entrar na América pelas autoridades). Porque é que escolhi o dia de hoje para reproduzir este texto? Ora, deixem-se disso. A prosa chama-se 'Rehab Amy, the Wine House'. E estão lá todas as respostas.

 

 

Amy Winehouse foi a grande vencedora da noite dos Grammys, ontem em Los Angeles. Cinco, nada menos. O pior que lhe podia acontecer, digo eu. Amy tinha recebido seis indicações para os Grammy 2008, incluindo as quatro principais (Revelação do Ano, Álbum do Ano, Gravação do Ano e Música do Ano). Ganhou cinco estatuetas, saboreadas pela televisão já que não pôde recebê-las pessoalmente. O governo dos EUA negou visto à artista para cantar no Staples Center, sede da 50ª edição dos Grammys, atendendo aos escândalos habituais na rapariga. A pedido dos organizadores, Winehouse só poderia cantar numa performance televisiva em directo de Londres, onde mora e cumpre seus tratamentos anti-drogas. E assim foi.

Foi assim que uma perturbada garota de 24 anos acabou ontem premiada com cinco dos mais importantes galardões do show business mundial, numa noite que qualquer deslumbrado acha o sonho de uma vida. Mas que eu receio ter sido a pior coisa que poderia ter ocorrido à pessoa que veste o boneco de Amy, agora levada em ombros a ocupar uma residência no condomínio dos deuses, mas sem a mais que improvável lucidez que lhe diga ao ouvido (muitas vezes por hora, minuto, segundo) que se trata apenas de uma cedência de espaço, um aluguer caro, não uma compra definitiva de lugar vitalício. Que é preciso batalhar pelo lugar, dar mais e melhor de si a cada momento. Ou será o mesmo público que hoje lhe paga a renda a despejá-a na rua de todas as amarguras: o beco do arrependimento.

Aos ouvidos de Amy sopram agora as mesmas vozes que sempre se encontram ao redor de um vencedor, os que dizem só o que sabem ser do agrado de quem ouve, sem risco de contraditório. Take it for granted, dir-lhe-ão. E ela vai gostar de ouvir, pelo que if they want to send me for rehab I'll say no, no, no. Em volta de uma Amy já em desequilíbrio estão agora os pesos mortos, rapaziada do elogio, pessoal da lingua no coiso, mestres da graxa e sugadores de luxo em qualquer palhinha que se ponha a jeito. O peso de todos, num equilíbrio já de si precário, fará cair o chão e desabar o tecto do sucesso. Depois pôr-se-ão a milhas. E só na solidão do abandono das sanguessugas e dos cínicos, dos lacaios e dos bobos, dos falsos e dos merdas, é que Amy Winehouse vai encontrar um dia o seu caminho da glória. Ou não, quem sabe fica pelo caminho, como tantos outros fenómenos que não se souberam gerir enquanto tal. Que só deram pelo valor do seu talento quando já toda a gente tinha secado as lágrimas por este se ter suicidado. Será uma pena se assim for também com esta garota, pouco mais, brinquedo nas mãos das bruxas que batem palmas ao petisco da rentável novidade. E que querem tanto rehab como ela, alucinada. Amy Winehouse sem drogas? Podia até ser engraçado, mas não vendia. Amy é mais que a pessoa que canta, é o boneco escandaloso que pisca o olho à moda, que é quem paga as contas. Do encanto do espectáculo faz parte a sua própria degradação, que o público paga para ver como quem vai ao circo ver o leão comer o prior, neste moderno freak-show global.

Amy Winehouse é um fenómeno da pop, uma genuína alma de artista perdida numa embalagem de sofrimento e desespero. Uma voz de timbre único, uma sensibilidade selvagem e um ritmo original, próprio, inventado, criado, seu de berço. Uma eleita, inocente dessa culpa. O que ela tem que a faz genial ela não domina, não compreende, não vê e não valoriza. Para ela, tal como está, a felicidade ainda mora no nevoeiro e o amanhã não existe. Aos 24 anos, Amy segue em rota de colisão com o seu próprio futuro, embalada na asneira por não conseguir chegar com o pé ao travão da maturidade. A noite de ontem, ao carregá-la com mais cinco pesos de estrelato, só chamou mais gente para ajudar a empurrar a tragédia. Só deu velocidade ao inevitável, suspeito. Porque o espectáculo, esse, tem que continuar sempre, custe o que custar. E custe quem custar no caminho.

 

31
Mai08

Um palhaço de Deus

Rui Vasco Neto

O meu amigo Daniel de Sá está enfatuado. Sim, é factual, está enfatuado. Estou evidentemente a adjectivar a partir do termo 'enfatuated', que eu sempre achei uma graça exactamente pelo aparente paradoxo semântico que carrega. Mas não estou a fazê-lo à toa, tenho cá as minhas razões para o que digo. Ora vejam. «Meu caro, se o texto abaixo te parecer que merece publicação, cedo-to com muito gosto. Aliás, escrevi-o especialmente para o nosso Sete Vidas.Vai também uma foto da moça, vestida de palhaço, ela de certeza não se oporá. Isto é surpresa que eu quero fazer-lhe.» Junta-lhe «Um abraço» e manda com o texto que se segue e que eu li, como os senhores vão ler. E vão perceber, como eu percebi, que ele não está apaixonado, babado, alvoraçado, encorajado, nada de nado: ele está é enfatuado, isso sim. E eu, fã incondicional das almas gentis neste mundo ogre e egoísta, não só percebo como dou a minha benção. E passo a publicar.

 
Em baixo: "Um palhaço de Deus"
Sete vidas mais uma: Daniel de Sá

 

 

A Cristina é uma amiga brasileira que diz que me ama. Mas calma aí, os brasileiros usam com muito menos restrições do que nós este verbo, pois a nossa tradição secular de marialvismo faz-nos pensar no amor como sendo sempre de perdição, Camilo e Ana Plácido, Simão e Teresa. Ela ama também as personagens dos meus romances, e sofre com elas. E briga comigo se não salvo um condenado de Auschwitz ou se não caso um pastor com a sua pastora. E ama os leprosos, os drogados, os sem abrigo, para que sofram um pouco menos. É capaz de se vestir e pintar de palhaço para os fazer sorrir. Entre os leprosos, há quem tenha sido levado aos vinte anos, à força, porque uma mancha suspeita lhe apareceu no corpo. Há quem tenha estado escondido no mato, para não ser caçado como um cão vadio. Há quem tenha ido para esse desterro definitivo por uma alteração da pele que nada tinha que ver com a doença maldita. Há quem se tenha casado na leprosaria e tido filhos que nunca mais pôde tocar, só de vez em quando os vendo de longe. E mesmo assim conseguem ser felizes...

 

Um dos leprosos que a Cristina ama muito é “cadeirante”, palavra suave para dizer que está amarrado a uma cadeira de rodas. Chama-se João e é doente mental. Pelo Natal, desejou um rádio, e a Cristina ofereceu-lhe um. Mas o que ele mais queria era ver as luzes, principalmente as da Avenida Beira Mar. Ela quis levá-lo no seu carro a passear pela cidade, mas não lhe deram autorização para isso. Então resolveu levar as luzes até ele. A Cristina contou-me isto assim: “Levei um monte de pisca- pisca, decorei um quarto e o levei para ver as luzes e ao abrir a porta ele falou: É uma reunião de vagalumes.”

Quando a Cristina está triste, porque não consegue ser palhaço de si mesma, vai até à Avenida Beira Mar e pensa que aquilo bastaria para fazer o João feliz.

 

31
Mai08

Bom dia. Hoje eu gosto é dos gajos do norte, carago!

Rui Vasco Neto
29
Mai08

"Oh!, sim, eu vivo em Portugal!"

Rui Vasco Neto

Não sou eu, juro, é este meu lado criativo que é irrequieto, metediço, um chato de primeira. E depois também acho um verdadeiro desperdício não aproveitar este símbolo para uma nova e grande campanha institucional, na linha do 'Vá para fora cá dentro' (uma frase, de resto, que tem neste símbolo uma ilustração, a bem dizer, assim a atirar para o literal, digo eu...adiante). Pois eu vejo já as linhas de fundo (ui!) da campanha. Para começar, o jargão, a legenda, o mote, a inspiração de milhões. E aí eu acho que não existe a mínima dissonância no essencial, estamos todos seguramente de acordo que este símbolo ilustra na perfeição a realidade do cidadão nacional na questão dos combustíveis. Certo? Esta imagem diz bem e diz quase tudo da profunda (cada vez mais profunda) satisfação que nos invade a todos, a cada nova aurora neste nosso Portugal dos pequeninos mas ladinos, pelo maravilhoso privilégio que nos é dado usufruir de poder viver neste país  -  pagando, evidentemente. Por tudo isto e mais, muito mais, eu cá resumiria a campanha nestas duas componentes, a imagem (forte, potente, explícita) e este chavão, que diz tudo, no qual todos os portugueses nesta altura se revêem com certeza:

"Oh, sim, eu vivo em Portugal!".

 

28
Mai08

Os burros do costume

Rui Vasco Neto

Não, a ideia já não é inédita, longe disso. A notícia é que é de hoje, isso sim: 'Aumento dos combustíveis motiva protesto com burro', conta o JN. Aliás, se bem se recordam, nestas coisas de protestos, seja contra o aumento dos combustíveis, portagens, preços dos bens essenciais ou mesmo um barulho generalizado contra as políticas governamentais, o recurso aos burros está em vias de se tornar uma táctica relativamente comum. É verdade sim senhor. Talvez mesmo algo vulgarizada, até, por força do baixo custo deste tipo de protesto, normalmente disponível sem dificuldades de maior, bem como do impacto visual da imagem, sempre ao gosto dos meios de comunicação que não regateiam um maior destaque editorial sempre que há burros pelo meio para fotografar.

 

Talvez por isso esta nova polémica com burros, combustíveis, burros, protestos e burros me tenha feito recordar um algarvio castiço que, aqui há uns anos atrás, (no consulado Guterres, se não estou em erro) veio do algarve a Lisboa, montado no seu burro e acompanhado quase passo a passo pelas equipas de reportagem de tudo quanto era meio de comunicação social, numa cobertura em directo do grande acontecimento, tudo com a alegada intenção de ver o primeiro ministro que nesse dia, por acaso, estava exactamente ... no Algarve. Mas nem por isso o sr. João se atrapalhou, que os objectivos da viagem foram largamente alcançados com a publicidade conseguida pelo seu burro.

 

Só que hoje, mais de dez anos passados sobre essa iniciativa ao tempo original, o que nos é dado constatar não é brilhante, convenhamos. Governos passaram, políticas e políticos mudaram, uma nova geração de portugueses cresceu e dá hoje as cartas no grande jogo da sobrevivência diária deste país que somos. Mas a fotografia da nossa insatisfação, a grande imagem do protesto deste Portugal cansado de lutar pelos seus direitos, o retrato dessa enorme frustração de nós todos, esse não mudou passados todos estes anos, todos estes políticos e todos estes governos. Continuamos iguais a nós próprios, nesse particular. Na hora do protesto, na hora da verdade, é certo que só aparecem os mesmos, os de sempre, dizendo o mesmo, o de sempre, para acabar tudo na mesma, como sempre, protesto atrás de protesto, burro atrás de burro. Para mim não tem dúvida, nestas alturas: somos mesmo os burros do costume.

27
Mai08

O Sodomita

Rui Vasco Neto

Excelente exemplo do talento do cartoonista Henrique Monteiro, cujo trabalho pode ser apreciado aqui, onde fui sacar este cartoon a que o Henrique chamou 'O Sodomita'. Uma publicação que é uma estreia aqui no 7Vidas, com a merecida vénia e os meus agradecimentos, naturalmente. Mais o aplauso de todos nós.

27
Mai08

O costume: gajas!

Rui Vasco Neto

Pág. 1/7

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