As tardes de Mário
Ao arrepio das expectativas de todos aqueles que esperariam encontrar Tony Carreira, Ágata ou mesmo Quim Barreiros a abrilhantar a emissão de hoje d'"As tardes de Júlia" na TVI, a produção do programa optou por convidar o Dr.Mário Soares, também artista, para uma conversa em tom intimista sobre a Europa e sobre este novo conceito de ser um europeu. Um desafio interessante, atendendo ao perfil do convidado, pouco dado a este género de programas onde o discurso político é interrompido a espaços por concursos de treta e mensagens publicitárias de inteligência grau zero. No entanto Mário Soares aceitou o convite e lá esteve, que eu bem vi com estes dois e bem ouvi com o par dos outros, não foi coisa que me tenham contado e de que se possa duvidar. Aconteceu, de facto, que eu vi.
Igual a si próprio, o ex-Presidente da República portuguesa aceitou o convite de Júlia Pinheiro e lá marcou presença naquele espaço de entretenimento televisivo primário, onde toda e qualquer mensagem é reduzida à expressão mais básica e elementar da comunicação, uma pobreza confrangedora que é a nossa realidade enquanto país e povo, lamentavelmente. Assim, Soares não cantou, não dançou, não tocou piano e sobretudo não falou francês, graças a Deus. Mas nem por isso deixou de corresponder ao que de si era esperado enquanto convidado especial de um programa onde a banalidade tem um registo muito próprio e altamente apreciado pela audiência. E nesse registo é da mais elementar justiça reconhecer que Soares não desiludiu, antes pelo contrário, destacou-se pela positiva ao fazer ouvir a sua banalidade acima dos guinchos da apresentadora, conseguindo até fazer passar aqui e ali um ou outro conceito mais elaborado de cidadania e de cultura política e social. Uma coisa é certa, em jeito de balanço final desta prestação televisiva de Mário Soares: podem até estar longe, já, as noites de glória do ex-presidente. Mas enquanto existirem as tardes de Júlia temos homem, está visto, por muitos e bons anos. Temos homem.